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Curiosidades locais. O caçador de onças.
Até à década de 60 (1.960+) havia no sertão
do RN uma família que tinha como profissão “caçar onças”. Conhecemos a 4ª
geração dessa família de caçadores.
Vimos
na seção 4, deste Veredicto, que a flora nativa nas abas das serras do sertão
foi poupada da exploração agropecuária, por se tratar de uma área íngreme que
não permite o cultivo de lavoura ou campos de pastagem do gado. Na década de 60
existiam nessa área 2 tipos de onças – a onça vermelha, também chamada de onça
de bodes(comia caprinos e ovinos) e a onça pintada, de maior porte, que comia o
gado bovino. A caçada à onça se dava, exatamente, por ela dizimar os rebanhos
dos criadores de gado; sua carne não é boa de se comer. Estivemos muitas vezes
na casa dessa família que morava no estreito vale formado por duas serras; era
a única casa humana em um raio de 20km – era mesmo uma morada de caçadores de onças;
na parede havia muitos couros (curtidos) de onças e nos caibros do teto estavam
as patas das onças caçadas por aquela família; tudo simbolizava troféus, com
estória e histórias. Os país-de-família, seu Antonio e Dona Josefa tinham 4
filhos, sendo 3 machos e uma fêmea – todos participavam das caçadas à onça,
porém as mulheres, mãe e filha, só participavam quando a onça era “tocaiada”
dentro de uma área limitada por obstáculos físicos, normalmente uma furna em um
lajedo, diuturnamente vigiada por 6 cachorros vira-lata, treinados, e os 6
integrantes da família humana. O cerco ia se fechando, limitando-se o espaço da
onça, durante dias e noites nessa vigilância.
O
Filho mais velho, o Manoel (chamavam-no mané) apresentava, sutilmente,
trejeitos de feminilidade, o que, para o pai, era motivo de vergonha. Na frente
dos visitantes o rapaz não aparecia – ficava recolhido em um quarto, de onde
não saia enquanto a visita estivesse ali – era ordem do pai. O pai o submetia a
tarefas e trabalhos árduos e dizia: é pra você aprender a ser home. Durante as
caçadas Manoel ia sempre na retaguarda, demonstrando pavor, o que era motivo de
gozação ostensiva por parte dos seus irmãos (mais novos). Certa vez saíram à
caça, rastreando uma onça; Seu Antonio e os dois filhos mais novos iam na
frente, juntamente com 5 cachorros e mais atrás vinha o Manoel com o seu
cachorro inseparável; os cachorros da frente farejam o rastro da onça e latiam;
Manoel e seu cachorro permaneciam em silêncio e só atuariam quando a onça
estivesse no campo visual.De repente os caçadores e os cachorros perderam o
rastro da onça, como se ela tivesse ido pelo espaço. Os cachorros andavam em círculo
procurando, farejando sinal da onça, enquanto seu Antonio e os 2 meninos
permaneciam debaixo de uma grande árvore frondosa , local onde haviam perdido o
rastro da onça; Manoel e seu cachorro estacionaram a uns 10 metros desse local,
aguardando ordens para prosseguir na caçada. Todos tinham uma espingarda, uma
peixeira(ou facão), pois sabiam que em determinadas ocasiões a onça, na sua
esperteza, não dava tempo para que o caçador usasse a arma de fogo, e o ataque
ao bicho tinha de ser na base da peixeira ou do punhal; à distância Manoel
havia engatilhado o seu bacamarte(espingarda) de 2 canos, pronto para
empregá-lo com precisão. Os cachorros e os caçadores haviam perdido o sinal da
onça porque o animal havia subido na árvore onde seu Antonio e 2 filhos estavam
acocorados, embaixo. A onça aproveitou o momento e pulou em cima dos 3, quando
então Manoel puxou os 2 gatilhos de sua arma de fogo, atingindo a onça que, com
o impacto do tiro estraçalhou a cabeça, quando então os caçadores acabaram de
matá-la com as armas brancas. Desse dia em diante Manoel foi tratado como herói
pelos pais e irmãos.
Com
a extinção da flora e da fauna do sertão esta história, hoje, pode parecer
estória, mas na época (década de 60) o
bicho onça era comum, como ainda o é no Nordeste Amazônico.
Transcrito do Informativo O Veredicto, desta mesma Fonte.
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